O Brasil é um dos primeiros países
do mundo a conhecer um protótipo do automóvel. Em 1871, antes de Amédée Bollée,
na França, dedicar-se à fabricação de veículos, a Bahia recebia um carro que se
auto-movia.
A Bahia tem, entre outras, duas
primazias: foi a primeira capital do Brasil e ganhou o primeiro automóvel
brasileiro.
A cidade de Salvador era uma
cidade importante, rica e “chique” que é como se dizia na época. As famílias
mais destacadas usavam a cadeira de arruar ou os corcéis, que eram tratados com
carinho especial – quando o Sr. Francisco Antonio Pereira Rocha importou seu
“automóvel”.
Eis como era o monstro: uma
máquina enorme, pesada e barulhenta, parecia com os atuais rolos compressores de
pavimentação, mas com uma quinta roda na frente, responsável pela sua direção.
Era movido a vapor e estava ligado a um carro destinado a acomodar os
passageiros, que, na sua roupa mais elegante, levantavam a cabeça, soberbos do
progresso de sua viatura.
O carro rodou por Salvador, para
espanto do povo que enchia as ruas para ver a novidade. Um dia alguém desafiou o
Dr. Rocha, dizendo que aquele monstrengo só andava no plano. Queria ver se subia
ladeira.
O homem pulou na defesa de seu
automóvel. O outro teimou. Então foi fechada uma aposta: iria à praça do
Mercado, subiria a Ladeira da Conceição da Praia e chegaria à Praça do
Palácio.
A notícia correu célere. Todo
mundo tomou conhecimento da aposta, e muitas apostas mais surgiram, uns defendo
o carro do Dr. Rocha, outros achando que ele, tão pesado e sem nada que o
puxasse, não agüentaria a ladeira.
No dia combinado, o Dr. Rocha
montou no veículo. O povo comprimia-se ao redor do monstrengo. O bicho
resfolegou e começou a andar. Encaminhou-se para a Ladeira. Um momento de
‘suspense”. Parece que o bicharoco nem deu pela mudança de nível: foi subindo
vagarosa mas firmemente. Quando despontou na Praça do Palácio, o povo que estava
nas janelas e enchia a rua, prorrompeu em aplausos.
O Dr. Rocha ganhou a aposta e
muita popularidade. Não se falou noutra coisa durante muito tempo.
Umas das coisas que mais
impressionaram o baiano, no caso do automóvel primitivo, foi o fato de ele ter
as rodas cobertas de borracha. Tanto assim que logo surgiu uma quadrinha
popular, que ficou no folclore bai
ano
muito tempo. Dizia ela:
“Havemos de ver dos
dois
O que aperta ou
afrouxa:
Do Lacerda o “parafuso”
Ou a “borracha” do
Rocha
O parafuso do Lacerda é o ascensor
da época ligando a Cidade Baixa à Cidade Alta. A borracha do Rocha é o primeiro
automóvel de rodas de borracha, do Dr. Francisco Antonio Pereira
Rocha.
O fim da primeira excursão do
carro brasileiro foi melancólico: de volta de uma excursão ao Rio Vermelho, à
margem do Dique, partiu-se uma peça do veículo.
Os passageiros não tiveram outro
recurso senão voltar de trole: vieram para a cidade num dos troles da “Trilhos
Centrais”.
Segundo algumas informações, não
confirmadas, o automóvel a vapor do Dr. Rocha teria ido ao Rio Grande do
Sul.
Se isso é verdadeiro, foi a velha
caranguejola arrancar mais aplausos e espantos. Agora nos pampas.
SANTOS DUMONT MAIS UMA VEZ
PIONEIRO
O primeiro automóvel de motor a
explosão que o Brasil ganhou foi um presente de Santos Dumont. O brasileiro
apaixonado por mecânica estava em Paris quando surgiram os primeiros carros.
Interessou-se imediatamente pela novidade. Não era fácil, em 1890, adquirir um
carro: é ele que confessa no seu livro “Meus Balões”. Teve que percorrer várias
usinas procurando o melhor. Acabou, em 1891, comprando um Peugeot. Foi um dos
primeiros fregueses da grande fábrica francesa.
Santos Dumont trouxe esse carro
para o Brasil. Menos para andar, do que para estudá-lo.
Quem sabe o que aprendeu Santos
Dumont daquele motor, naquele novo veículo? O que deverá a aviação a esse
primeiro motor Peugeot?
Há um documento na prefeitura de
São Paulo no qual Henrique, irmão de Santos Dumont é o automobilista pioneiro da
capital bandeirante.
Não conseguimos apurar se esse
carro é o mesmo que o “Pai da Aviação” trouxe, ou se Henrique importou
outro.
Se Santos Dumont, nas suas
experiências, não destruiu o Peugeot, o carro é o mesmo.
No ano seguinte ele voltaria a
Paris e não levaria carro algum na sua bagagem.
Mas de qualquer forma credite-se a
Henrique, morador em São Paulo, o pioneirismo do carro bandeirante.
Henrique, irmão de Alberto, era o
primogênito da família. Por ter nome idêntico ao pai, alguns autores fazem
confusão e citam o pai de Santos Dumont como o possuidor do primeiro carro
paulistano. Mas era o filho, mesmo, porque em 1901 o chefe da família já havia
falecido.
Há um documento onde ficou firmado
o pioneirismo de Henrique Santos Dumont em automóvel a explosão na cidade de São
Paulo: é o requerimento que faz, datado de 1901, ao governador da cidade
requerendo baixa do lançamento do imposto sobre seu automóvel.
Eis as razões do
peticionário:
“...o suplicante sendo o primeiro
introdutor desse sistema de veículo na cidade, o fez com sacrifício de seus
interesses e mais para dotar a nossa cidade com esse exemplar de veículo
“automobile”; porquanto após qualquer excursão, por mais curtas que sejam, são
necessários dispendiosos reparos no veículo devido à má adaptação de nosso
calçamento pelo qual são prejudicados sempre os pneus das rodas. Além disso o
suplicante apenas tem feito raras excursões, a título de experiência, e ainda
não conseguiu utilizar de seu carro “automobile” para uso normal, assim como um
outro proprietário de um “automobile” que existe aqui também não o
conseguiu”.
Por esse documento ficamos sabendo
que existia um segundo carro na cidade de São Paulo, em 1901. Depois de
demoradas pesquisas acreditamos que o nome de seu possuidor tenha sido o Conde
Álvares Penteado.
Além do mérito histórico dessa
petição do Dr. Henrique Santos Dumont o documento tem uma outra característica:
é a primeira reclamação de um dono de automóvel ao poder público contra as más
estradas e as ruas em péssimo estado de conservação.
Mais de 100 anos depois, em muitas
cidades do Brasil ainda é atual o sentido da petição do Dr. Santos Dumont: as
ruas continuam péssimas e são as responsáveis maiores pelo estrago dos
veículos.
Pena que requerimento idêntico
tenha a característica do primitivo: inócuo.
O NORTE NO COMEÇO DO
SÉCULO
O norte do Brasil também recebia
automóveis. Já vimos o pioneirismo da Bahia no caso do automóvel do Rocha.
Agora, no início do século, Salvador recebe outro carro. Este, já um verdadeiro
automóvel. Não mais um “rolo compressor”.
A marca do carro é “Clément”,
francês. O motor é Panhard & Levassor. O ano de fabricação, 1895.
Chegou em Salvador em fevereiro de
1900 e foi importado pelo Dr. José Henrique Lonat. Fez, como seu antecessor a
vapor, muito sucesso.
Por volta de 1902 a 1904, Manaus,
a bela capital da borracha passava por um surto de progresso entusiasmante.
Casas nasciam do dia para a noite, ruas novas eram abertas a todo instante,
avenidas eram rasgadas sobe as melhores condições de urbanismo. Palácios, pontes
de aço, porto flutuante, Ópera de Paris, banhos de champanha, havanas acesos com
notas de conto de réis, etc.
Uma febre de progresso provocada
pelo vírus da borracha. Os filhos das famílias ricas preferiam ir estudar na
Europa e não no Rio de Janeiro – pois tinham mais ligações com a França e a
Inglaterra do que com a própria capital do seu país.
Também nessa época chegou o
automóvel em Manaus. Era francês, de marca “Ranault”, tipo “double-phaeton”,
aberto.
Foi importado pelo engenheiro Dr.
Antonio de Lavandeyra, que era o diretor-presidente local da “Manaus Harbour
Limited”, a companhia inglesa que construía o porto flutuante da capital do
Amazonas.
E São Luis do Maranhão, outra
florescente capital do Norte, ao que nos consta, esperou quase 20 anos depois de
Manaus para receber seu primeiro automóvel: era um Willys-Knight que ali aportou
em 1920.
Importou-o o engenheiro Luiz
Rodolpho Cavalcanti de Albuquerque Filho, que ali executava vários trabalhos
profissionais e que também construíra o porto flutuante de Manaus e viria, anos
mais tarde, ser um dos diretores do Touring Club e vice-presidente do Automóvel
Club do Brasil, no Rio de Janeiro.
PRIMEIRO AUTOMÓVEL DO RIO DE
JANEIRO
O primeiro automóvel mesmo, de
motor a explosão, do Rio, foi de Fernando Guerra Duval, então estudante de
engenharia, irmão de Adalberto Guerra Duval embaixador do Imperador na corte do
Tzar da Rússia. Algumas publicações consignam Guerra Duval como “artista”. Não é
verdade: ele foi engenheiro, formado pela Escola Politécnica. Seus
contemporâneos afirmam que de artista ele possuía apenas o
temperamento.
O carro de Guerra Duval era um
“Decauville” e aqui circulou em agosto de 1990. Seu motor a gasolina, era de 2
cilindros. Na falta do combustível, Guerra Duval ia às farmácias e comprava
benzina.
O carro era aberto, sem capota. O
escapamento era livre e fazia muito barulho. Em lugar do volante, a direção era
em forma de guidon de bicicleta.
O carro de Guerra Duval foi um
sucesso no Rio e adjacências. Porque ele não circulou apenas na Capital. Andou
também em Petrópolis – onde foi numa prancha da Estrada de Ferro, pois não havia
estrada – e causou espanto aos veranistas da pacata e fria Cidade
Imperial.
PRIMEIRO AUTOMÓVEL DE
MINAS
O primeiro automóvel que circulou
em Minas pertenceu ao Sr. João Pinheiro. Fazia o trajeto entre Caeté e Sabará –
perto do antigo Curral d’el Rei, onde se riscavam as ruas da nova cidade,
nascida Capital e que se chamou Belo Horizonte.
O trecho Caeté-Sabará, foi,
também, a primeira estrada rodoviária de Minas Gerais – construída pelo próprio
João Pinheiro exclusivamente para passar o seu automóvel.
A data desse evento não é segura:
enquanto alguns dão 1902, o engenheiro Odilon Dias Pereira afirma ter sido em
1905.
Uma coisa é certa: a estrada não
foi construída por capricho, nem o automóvel foi comprado para gozo pessoal.
João Pinheiro adquiriu o carro e fez a estrada para transportar as produções da
Cerâmica Nacional, de Caeté, para Sabará.
A distância entre Caeté e Sabará
era de 20 quilômetros e o automóvel de João Pinheiro cobria o percurso em quatro
horas, fazendo uma média de 5km por hora!
PRIMEIRO AUTOMÓVEL DO
MARANHÃO
Pesquisar a
história dos automóveis é muito interessante, mas quando descobrimos a história
dos automóveis no Brasil é melhor ainda. Notório antigomobilista maranhense,
Fernando Silva vive às voltas com a história dos automóveis, de sua cidade São
Luis e do estado do Maranhão. Fernando nos enviou o texto digitalizado da obra
em sua 3ª. edição assinada pelo jurista, escritor, membro e ex-presidente da AML
Dr. Jomar Moraes do ‘Dicionário-Histórico Geográfico da Província do Maranhão’
tendo como autor original da obra Dr. Cesar Augusto Marques, doutor em medicina,
professor de matemática e membro Instituto Histórico Geográfico e Etnográfico do
Brasil, já falecido. Rendemos as nossas homenagens a estes senhores que
preservam a história.
Obra: ‘Dicionário-Histórico Geográfico da Província
do Maranhão’
Lançamento da 3ª. Edição: Dia 05 de maio de 2009 na Academia
Maranhense de Letras
Imagens digitalizadas: Fernando Silva (acervo
pessoal)
Abaixo o texto transcrito:
‘O automóvel foi introduzido no
Maranhão em 1905, graças ao comerciante e industrial Joaquim Moreira Alves dos
Santos, maranhense de espírito progressista, a quem a nossa terra natal deve
outras iniciativas muito úteis. Naquele ano ela mandou buscar um automóvel
Phaeton, de 4 lugares, do fabricante inglês Speedwel , equipado com motor
francês De Dion Bouton, monocilíndrico e para gasolina. O carro chegou a São
Luis em novembro. Mais tarde vieram dois outros automóveis, um dos quais para
este mesmo maranhense e outro para nosso conterrâneo comerciante José da Cunha
Santos Guimarães. Ainda do primeiro decênio do séc. XX é o aparecimento do
primeiro auto-ônibus para passageiros, iniciativa de uma empresa organizada pelo
primeiro desses maranhenses.’

(Primeiro Automóvel do Maranhão - Colaboração:
www.antyqua.com.br)
AS PRIMEIRAS CARTEIRAS DE
MOTORISTAS
Os primeiros carros que aqui chegaram eram conduzidos por
leigos que, por iniciativa própria, puxando esta alavanca, empurrando aquele
pedal, mexendo aqui, fuçando ali – conseguiram por o veículo em movimento e
levá-lo pelas acanhadas ruas do Rio.
O motorista habilitado só apareceu
em 1906 – embora o decreto nº 858, de 15 de abril de 1902, exigisse exame de
condutores de automóveis.
A primeira comissão examinadora de
candidatos a condutores de veículos era constituída de engenheiros da
Prefeitura. Os que lavraram os primeiros termos de habilitação de motoristas
cariocas foram os Drs. Afonso de Carvalho, Aníbal Bevilacqua e Arthur Miranda
Ribeiro.
O primeiro exame para motorista
foi realizado no dia 08 de janeiro de 1906. Foram aprovados os seguintes
examinados: Manuel Borges (Panhard & Levassor); Ernani Borges (Decauville);
Francisco Leite de Bettencourt Sampaio Jr. (Darracq); Carlos Inglez de Souza
(Darracq) e José de Almeida.
No dia 19 de janeiro, houve mais
três “diplomados”: Engenheiro José Augusto Pereira Preste; João Vasques Martins
e Honório Guimarães Moniz.
A 7 de fevereiro seguinte houve
novo exame. Ficaram habilitados: João Vieira da Silva Borges e Felisberto
Caldeira.
É interessante frisar que
Felisberto Caldeira foi cocheiro dos carros dos presidentes Campos Salles e
Rodrigues Alves e o primeiro “chaffeur” do Palácio do Catete.
Daí por diante os exames se
sucediam habitualmente duas vezes por mês.
Pouco a pouco o Rio foi tendo
motoristas, amadores e profissionais, habilitados pela seção competente da
prefeitura.
Modelo de
Carteira de Motorista emitida pela Pref. de Curitiba em 1913
PRIMEIRA CORRIDA DE AUTOMÓVEL DA
AMÉRICA DO SUL
A primeira corrida oficial de
automóvel da América do Sul realizou-se em São Paulo, em 26 de julho de 1908,
entre São Paulo e Itapecerica, num percurso de 80 quilômetros.
Não houve acidentes, apesar da
poeira e do terreno áspero e acidentado. O vencedor foi o desportista Dr. Silvio
Penteado, com seu Fiat de 40HP. Em Santo Amaro, o carioca Gastão de Almeida leva
5 minutos de vantagem sobre os outros competidores da categoria D. Mas o
reservatório de óleo do seu Dietrich-Lorraine cai a seis quilômetros da chegada.
Então, Silvio Álvares Penteado o ultrapassa e consegue chegar em primeiro lugar,
sob um tempestade de aplausos.
Eis o percurso: do Parque
Antártica, em São Paulo, até Itapecerica os carros tinham que atravessar a
Consolação, Av. Paulista, Arco Verde, Pinheiros, Botequim, Pirajussura, M. Boi
passando por fora de Itapecerica, e voltando por M. Boi Mirim, Santo Amaro e
indo sair na Av. Paulista.